A Viagem do Elefante
– José Saramago

O interesse dos portugueses pelo elefante Salomão diminuiu com o passar do tempo, até perder a importância para o rei Dom João III e para a rainha Catarina da Áustria, sua esposa.

Cornaca descuidado

O agradável elefante Salomão, que tinha o indiano Subhro como cornaca, se viu sujo, desolado, mal acomodado e esquecido pela corte portuguesa.
mosteiro-dos-jeronimos-1Para dar utilidade a Salomão e retirá-lo das proximidades do Mosteiro dos Jerónimos, localizado às margens do rio Tejo, o rei aventou a possibilidade de presenteá-lo ao arquiduque austríaco Maximiliano II, casado com a filha do imperador Carlos V, da Espanha, que ao ser consultado aceitou a oferta.
De imediato, para não haver retrocesso da aceitação, o rei Dom João III ordenou que fosse preparada uma comitiva para transportar o elefante até a cidade de Valladolid, na Espanha, onde o arquiduque se encontrava hospedado.
Para completar o presente, juntamente com a comitiva, seguiu o cornaca, responsável por cuidar de Salomão.

Shiva, Parvati e Ganesha

shiva-parvati-e-ganesha-lO cornaca, que demonstrou muita inteligência e habilidade de relacionamento, durante a viagem, terminou sendo admirado pelo comandante da comitiva, por contar histórias sobre o Deus indiano Shiva, casado com Parvati.
A história dos deuses induziu o respeito da comitiva por Salomão por que Ganesha, filho de Shiva, voltou a viver após ter sua cabeça substituída por uma de elefante.
Apesar das dificuldades do percurso, a comitiva chegou ao Castelo Rodrigo e aguardou as tropas austríacas, para adentrar no território espanhol ao encontro do arquiduque Maximiliano.
Enquanto isso, o comandante português aproveitou para mandar de volta a Lisboa os trinta trabalhadores que acompanharam a comitiva.
Após discussões entre os comandantes português e o austríaco, para saber quem tinha o direito ou obrigação de levar Salomão até Maximiliano, resolveram negociar e seguiram juntos para o cumprimento da tarefa.
O cornaca, por sua vez, preocupado com o seu destino que seria definido pelo arquiduque, observava o desenrolar das negociações.

Fritz em vez de Salomão

Ao se apresentar ao arquiduque, Subhro foi orientado a colocar uma gualdrapa sobre Salomão e foi surpreendido com a mudança do seu nome para Fritz e o do elefante para Solimão.
A tropa portuguesa retornou a Lisboa e o cornaca seguiu junto com os austríacos em direção a Viena.
Acomodaram o elefante no mesmo barco que transportou, até a Itália, a tropa, os serviçais, o arquiduque e sua mulher.
Lá chegando, uma manobra do padre da Basílica de Santo Antônio de Pádua, convenceu o cornaca a levar Solimão até a porta da igreja.

O milagre fajuto

Na presença dos fiéis, o elefante dobrou o joelho simulando um milagre.

Não ficou por menos, o arquiduque chamou Fritz para um esclarecimento e obteve a confissão da farsa.

Sem alternativa para substituição do cornaca, Maximiliano, prosseguiu a viagem sob neve, cujo percurso foi feito com dificuldade pelo animal desacostumado com o frio.

Solimão sofreu o pão que o diabo amassou, porém, aproveitou as duas oportunidades que lhe foram dadas para se redimir da simulação do milagre.

A primeira oportunidade ocorreu quando a arquiduquesa caiu numa ribanceira e, de pronto, foi resgatada pelo elefante.

A segunda oportunidade ocorreu ao entrar em Viena, o elefante enroscou a tromba numa criança de cinco anos devolvendo-a a seus pais, no momento em que todos achavam que o acidente estava por acontecer.

Estilo Saramago

pata-de-elefante-1A forma tradicional da escrita e em especial a utilizada neste texto é ainda mais descomprometida que as dos livros “Ensaio sobre a cegueira” e “As intermitências da morte”.

Saramago dá um show ao fazer citações e comparações com passagens bíblicas.

Enaltecer aspectos da inteligência de pessoas humildes e registra o afeto e preocupação do homem em relação aos animais.

O texto foi escrito devido a reação do autor pelo fato de ter encontrado, em um hotel, uma pata de elefante servindo como porta guarda-chuvas.

Leitura recomendadíssima!

José de Souza Saramago

jose-saramago-1O escritor, tradutor, jornalista, poeta, cronista, dramaturgo, contista, romancista, teatrólogo e ensaísta José de Souza Saramago nasceu na aldeia de Azinhaga, província do Ribatejo, Portugal, no dia 16 de novembro de 1922.

Faleceu, aos 87 anos, na sua casa em Tías, Província de Las Palmas, Lanzarote, comunidade autônoma das Ilhas Canárias, no dia 18 de junho de 2010, vítima de leucemia crônica. Foi cremado e as cinzas foram depositadas ao pé de uma oliveira, na cidade de Lisboa no dia 18 de junho de 2011.

Prêmios

Saramago recebeu vários prêmios dentre eles o Nobel de Literatura de 1998 e o Camões de 1995. Foi condecorado com Comendador da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada, em 1985, e o Grande-Colar da mesma Ordem, em 1998. Esta última honraria é concedida, normalmente, a chefes de estado.

O prêmio Camões foi instituído, em 1988, pelos governos do Brasil e Portugal outorgado a autores de língua portuguesa, pelo conjunto da sua obra e o Prêmio Nobel de Literatura foi instituído, em 1901, para premiar autores, de qualquer nacionalidade, que a sua obra tenha contribuído para o pensamento coletivo.

José Saramago recebeu, também, os seguintes prêmios: Cidade de Lisboa (1980), Literário Município de Lisboa (1982), P.E.N. Clube Português de Novelística (1983, 1985), D. Dinis (1984), Crítica da Associação Portuguesa de Críticos Literários (1985), Grande Prémio de Romance e Novela APE/DGLB 1991, Bordalo de Literatura da Casa da Imprensa (1991), Grande Prémio Vida Literária APE/CGD (1993), Gold Medal.svg Prémio Camões 1995 e Consagração de Carreira da Sociedade Portuguesa de Autores (1995).

Linguagem e estilo

José Saramago se caracteriza pela utilização de um estilo oral. Preferiu se expressar na forma escrita com a animação característica dos contos populares de tradição oral. Preferiu a dinâmica da comunicação em detrimento da correta ortográfica formal.

A forma escolhida para desenvolver o raciocínio e exibir argumentos característicos da linguagem oral se impõe no estilo convincente.

Utiliza frases e períodos alongados, com pontuação nada convencional, que resulta em diálogos entre personagens sem a separação tradicional de travessões usuais para distinguir os diálogos de cada um dos interlocutores. Esta forma utilizada pelo autor conserva o leitor atento à história, contudo, em determinados momentos pode confundi-lo.

As citadas características tornam o seu estilo único na literatura moderna, destacando-o como um inovador no tratamento da língua portuguesa.

Relacionamentos

O primeiro casamento foi aos 25 anos com Ilda Reis. Deste relacionamento resultou o nascimento da filha Violante dos Reis Saramago. Durou de 1944 a 1970.

De 1970 a 1986 Saramago viveu com a escritora Isabel da Nóbrega.

O último relacionamento foi com a jornalista e tradutora espanhola María del Pilar del Río Sánchez, que conheceu em 1986. Viveu a seu lado de 1988 até a morte do autor.

Crença, Política e foco literário

jose-saramago-2Saramago se dizia ateu e faz crítica à Igreja por entender encontrar-se a serviço dos tiranos. Fala de religião como um fenômeno de fantasias humanas. E diz que os episódios de violência relatados na Bíblia, como sacrifício de Isaque, a destruição de Sodoma ou a vida de Jó, por exemplo, revelam que “Deus não é de fiar”.

A Igreja Católica criticou a publicação do livro ‘O Evangelho Segundo Jesus Cristo’, em 1991, devido à releitura que Saramago faz do personagem Jesus. Fez críticas, também, quando da publicação de ‘Caim’, em 2009.

Foi membro do Partido Comunista Português.

Posicionou-se sempre atento às injustiças e vigilante das mais diversas causas sociais. Não se cansava de questionar valores sociais.

Criou, em 2007, a Fundação José Saramago para a defesa e difusão da Declaração Universal dos Direitos Humanos e defesa do meio ambiente. Mais tarde, em 2012, sua mulher Pilar del Río abriu as suas portas da fundação ao público na Casa dos Bicos em Lisboa.

Apesar das crônicas e peças teatrais Saramago se destacou com os temas abordados em seus romances.

Em ‘Levantando do Chão’ o autor retrata as dificuldades da população pobre do Alentejo.

Em ‘Memorial do Convento’ retrata o contraste entre a abastada aristocracia e o povo trabalhador.

Em seguida Saramago publicou livros cujos temas se referem a pessoas, fatos e questionamentos religiosos: ‘O Ano da Morte de Ricardo Reis’ (1985), sobre as andanças do heterônimo de Fernando Pessoa por Lisboa; ‘A Jangada de Pedra’ (1986), em que se questiona o papel Ibérico na então CEE através da metáfora da Península Ibérica soltando-se da Europa e encontrando o seu lugar entre a velha Europa e a nova América; ‘História do Cerco de Lisboa’ (1989), onde um revisor é tentado a introduzir um “NÃO” no texto histórico que corrige, mudando-lhe o sentido; e ‘O Evangelho Segundo Jesus Cristo’ (1991), no qual Saramago reescreve o livro sagrado sob a ótica de um Cristo que não é Deus e se revolta contra o seu destino.

Saramago deu início a nova fase publicando seis romances com tramas que abordaram os caminhos da sociedade contemporânea: Ensaio Sobre a Cegueira (1995); Todos os Nomes (1997); A Caverna (2001); O Homem Duplicado (2002); Ensaio sobre a Lucidez (2004); e As Intermitências da Morte (2005).

Obras publicadas

Saramago publicou os romances Terra do Pecado (1947), Manual de Pintura e Caligrafia (1977), Levantado do Chão (1980), Memorial do Convento (1982), O Ano da Morte de Ricardo Reis (1984), A Jangada de Pedra (1986), História do Cerco de Lisboa (1989), O Evangelho Segundo Jesus Cristo (1991), Ensaio Sobre a Cegueira (1995), Todos os Nomes (1997), A Caverna (2000), O Homem Duplicado (2002), Ensaio Sobre a Lucidez (2004), As Intermitências da Morte (2005), A Viagem do Elefante (2008), Caim (2009), Claraboia (2011) e Alabardas, Alabardas, Espingardas, Espingardas (2014).

Publicou as crónicas: Deste Mundo e do Outro (1971), A Bagagem do Viajante (1973), As Opiniões que o DL Teve (1974) e Os Apontamentos (1977).

Produziu as seguintes peças teatrais: A Noite (1979), Que Farei com Este Livro? (1980), A Segunda Vida de Francisco de Assis (1987), In Nomine Dei (1993) e Don Giovanni ou O Dissoluto Absolvido (2005).

Publicou os contos Objeto Quase (1978), Poética dos Cinco Sentidos – O Ouvido (1979) e O Conto da Ilha Desconhecida (1997).

Publicou as poesias: Os Poemas Possíveis (1966), Provavelmente Alegria (1970), O Ano de 1993 (1975).

Diário e Memórias: Cadernos de Lanzarote (1994) e As Pequenas Memórias (2006),

Literatura infantil: A Maior Flor do Mundo (2001), O Silêncio da Água (2011).

Viagens Viagem a Portugal (1983).

Referência bibliográfica

12696 - Viagem do elefante

Saramago, José, 1922
A viagem do elefante: conto / José Saramago. – São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
256p.
ISBN 978-85-359-1341-5
1. Contos portugueses. I. Título.
(R)

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