A divertidíssima história de uma cidade, que de fictícia só tem o nome, contada por Fernando Vita, registra fatos ocorridos quando o autor, ainda adolescente, ouviu e acompanhou o desenrolar de boatos que serviram para ocupar os desocupados e irritar os que, de alguma forma, cometiam deslizes, deixavam escapar sentimentos amorosos ou preferências sexuais.
Muito pouco do que eu me recordo passou despercebido pelo autor.
Palco da narrativa
O texto escrito em linguagem direta, com citações comuns em mesas de bares de cidades provincianas, a exemplo da que serviu de palco para desenrolar a narrativa, não agridem os tímpanos do leitor, devido à habilidade do autor em contar fatos ocorridos de forma hilária e desprovidos de ofensa.
Cada história se desenvolve de maneira única e terminam se entrelaçando.
As cartas anônimas, apresentadas como simples fotografias, se transformam em uma engraçada película.
O romance coloca a belíssima e desejada Boneca no centro de um contexto, fruto do imaginário do autor. Afinal, diz o autor tratar-se de uma ficção.
Personalidades e ‘meus prazeres’
Na cidade desprovida de heróis, citada por Fernando Vita, a bem da verdade existiu um.
Faça-se justiça: um dos estafetas citados no texto, Chebeu, foi agraciado com um emprego federal nos Correios e Telégrafos devido ao fato do seu pai, herói de guerra, ter lutado na Segunda Guerra Mundial.
O juiz Efraim, o grão-mestre Clinésio, Nadinho da Jegra, tenente Ludovico e Teófilo que tinha por profissão ser marido da professora, adornam a história de forma espirituosa.
Esse último, ao ser apresentado às pessoas dizia:
“– Sinta em suas partes os meus prazeres! Teófilo Amândio, seu criado, marido da professora Dina Gazinha, às suas ordens.”
O autor não deixou escapar a Madre Rosário, encarregada do convento que abrigava a jovem, bela e radiante Madre Maria Goretti, respeitadas obreiras educacionais.
O ócio, a vida alheia e os bêbados
As cartas anônimas chamavam a atenção dos desocupados que amavam comentar sobre a vida alheia.
Os conteúdos saíam dos papéis e circulavam de boca em boca acrescidos da imaginação e do azedume de quem os repicavam.
Há que perdoar os habitantes de Todavia (SAJ), afinal, nada se tinha a fazer à época.
O gerador que iluminava a cidade era desligado às vinte horas e na calada das noites enluaradas os cantores, tocadores, bêbados, políticos, poetas de meia tigela, desocupados por falta de trabalho e opções de lazer se encontravam nos bancos de jardins, botecos e puteiros – iluminados por candeeiros da marca Aladim – para comentarem sobre vidas de muitos que dormiam e de outros que perdiam o sono por terem seus nomes incluídos em muitas das Cartas Anônimas.
O livro, rico em humor, traz uma linguagem simples a exemplo dos moradores da antiga província.
Sem sombra de dúvida, é uma leitura divertidíssima para não dizer imperdível!
O risco é despertar, nos atuais moradores, a antiga prática das Cartas Anônimas, tão bem contadas por Fernando Vita.
Fernando Vita
Nasceu em 22 de dezembro de 1948, em Santo Antônio de Jesus, Bahia, Brasil.
Formou-se em jornalismo pela Universidade Federal da Bahia.
Trabalhou no Jornal da Bahia como repórter, editor e crítico musical. Foi repórter freelance do Jornal do Brasil e das revistas Veja e Istoé/Senhor.
Escreveu Tirem a doidinha da sala que vai começar a novela e O Avião de Noé.
Recebeu o Prêmio Braskem Cultura e Arte.
Referência bibliográfica
Vita, Fernando
Cartas Anônimas: uma hilariante história de intrigas, paixão e morte / Fernando Vita. – São Paulo. Geração Editorial, 2011.
181p.
ISBN 978-85-61501-60-0
1. Ficção brasileira – I. Título.
(R)
O livro é genial. recomendo entusiasmada…acabo de dar boas gargalhadas com ele…humor finíssimo e texto rico…:o))