O texto registra fragmentos de observações, pensamentos, experiências e conceitos do dia a dia do autor, catalogados por temas do cotidiano e pensamentos filosóficos.
Contextualizar as pequenas crônicas que tomam forma de um ensaio é sujeitar-se a um risco exagerado, até porque, os temas atingirão de forma diferente cada leitor.
Discorrer sobre a narrativa compromete a qualidade, afinal, são fragmentos da observação de um importante intelectual brasileiro que, com singeleza, nos brinda com muitos ensinamentos.
As fases da vida
“MINHA VIDA (…) se divide em três fases.
Na primeira, meu mundo era do tamanho do universo e era habitado por deuses, verdades e absolutos.
Na segunda fase meu mundo encolheu, ficou mais modesto e passou a ser habitado por heróis revolucionários que portavam armas e cantavam canções de transformar o mundo.
Na terceira fase, mortos os deuses, mortos os heróis, mortas as verdades e os absolutos, meu mundo se encolheu ainda mais e chegou não à sua verdade final mas à sua beleza final: ficou belo e efêmero como uma jabuticabeira florida.”
A eterna busca
“PSICANÁLISE – Conversa na recepção: Conversa vai, conversa vem, digo que sou psicanalista.
A moça entra em pânico, temerosa de que eu tivesse poderes para ver a sua alma. “
Eu já fiz terapia”, ela disse. “Mas agora estou resolvida.”
Pergunto: “Quando se deu o óbito?”.
Ela me olha sem entender. Óbito?
Explico: as únicas pessoas resolvidas que conheço estão no cemitério.”
Vida e morte
“MORTE – A vida, para ser, leva tempo, demanda paciência, exige cuidados, há que se esperar.
Mas a morte vem súbita e definitiva.
Uma árvore leva anos a crescer.
O machado a abate em poucos minutos.”
Nada se repete
“Heráclito foi um filósofo grego fascinado pelo tempo.
Contemplava o rio e via que tudo é rio.
Percebeu que não é possível entrar duas vezes no mesmo rio; na segunda vez, as águas serão outras, o primeiro rio já não existirá.
Tudo é água que flui: as montanhas, as casas, as pedras, as árvores, os animais, os filhos, o corpo…
Assim é tudo, assim é a vida: tempo que flui sem parar.”
A aparente simplicidade da escrita enriquece o seu conteúdo e permite ao leitor interromper a leitura, para maior reflexão sobre o que é dito. O retorno ao texto é revigorado.
Recomendadíssima a leitura!
Rubem Alves
Pedagogo, poeta, filósofo de todas as horas, cronista do cotidiano, contador de estórias, ensaísta, teólogo, acadêmico, autor de livros e psicanalista.
Rubem Alves é um dos intelectuais mais famosos e respeitados do Brasil.
Autor de vastíssima obra, já publicou textos sobre educação, meditações teológicas, crônicas e histórias infantis.
É membro da Academia Campinense de Letras, professor emérito da Unicamp e cidadão honorário de Campinas, onde recebeu a Medalha Carlos Gomes de contribuição à cultura.
Referência bibliográfica
Alves, Rubem, 1933 – 2014.
Do universo à jabuticaba / Rubem Alves. – São Paulo : Editora Planeta do Brasil, 2010.
ISBN 978-85-7665-708-8
1. Crônicas brasileiras I. Título.
Parabéns pelo artigo, adorei!