A origem do movimento cristão é retratada pelo autor após vinte anos de pesquisa realizada, nos Estados Unidos, nas Universidades Santa Clara, Harvard, e Santa Bárbara.
Procura recuperar a história de Jesus, antes do cristianismo, revelando os movimentos revolucionários ocorridos há mais de dois mil anos, que reuniram seguidores para um movimento messiânico com vistas a estabelecer o Reino de Deus.
Traição vista por Roma
A invasão ao Templo, em Jerusalém, motivou ações de Roma que resultaram na prisão e crucificação de Jesus, condenado por sedição.
“O crime de Jesus, aos olhos de Roma, foi o de buscar o poder político de um rei (ou seja, traição), o mesmo crime pelo qual foram mortos quase todos os outros aspirantes messiânicos da época.”
“(…) há apenas dois fatos históricos efetivos sobre Jesus de Nazaré nos quais podemos realmente confiar: o primeiro é que Jesus foi um judeu que liderou um movimento popular judaico na Palestina no início do século I d.C.; o segundo é que Roma o crucificou por isso.”
Paz e conflitos
“É difícil enquadrar Jesus de Nazaré em qualquer um dos movimentos político-religiosos conhecidos de seu tempo. Ele era um homem de contradições profundas, um dia pregando uma mensagem de exclusão racial (“Eu fui enviado apenas às ovelhas perdidas de Israel”, Mateus 15:24), no outro, de benevolente universalismo (“Ide e fazei discípulos de todas as nações”, Mateus 28:19); às vezes clamando por paz incondicional (“Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus”, Mateus 5:9), às vezes promovendo violência e conflitos (“Se tu não tens uma espada, vai vender teu manto e compra uma”, Lucas 22:36).”
Concessões do império
O Império Romano fez várias concessões aos judeus, para manter os seus governadores.
A devoção aos ritos religiosos dos judeus fossem eles hebreus, assírios, aramaicos, fenícios ou árabes não passava pelo entendimento de Roma.
Os aceitava para manter a convivência pacífica dos seus mandatários, desde que pagassem seus impostos e tributos.
Um touro e dois cordeiros
“Os judeus foram até mesmo dispensados da adoração direta do imperador, que Roma impunha a quase todas as outras comunidades religiosas sob o seu domínio. Tudo o que Roma pedia de Jerusalém era o sacrifício de um touro e dois cordeiros em nome do imperador e por sua boa saúde, duas vezes por dia. Continue fazendo o sacrifício, mantenha-se em dia com os impostos e tributos, siga as leis provinciais e Roma estará feliz em deixá-la em paz, bem como ao seu deus e ao seu templo.”
Profecias, um messias humano
“A crença em um messias divino teria sido um anátema para tudo o que representa o judaísmo, razão pela qual, sem exceção, todos os textos na Bíblia Hebraica que tratam do messias o apresentam no exercício das suas funções messiânicas na terra, não no céu.”
“Muitos judeus na Palestina do século I se esforçaram para viver uma vida de zelo, cada um à sua própria maneira. Mas houve alguns que, a fim de preservar os seus ideais zelosos, estavam dispostos a recorrer a atos extremos de violência se necessário, não apenas contra os romanos e as massas não circuncidadas, mas contra os compatriotas judeus, aqueles que ousaram se submeter a Roma. Eles foram chamados de zelotas.”
Pilatos injusto com judeus
Apesar dos evangelhos apresentar o governador romano Pilatos como um justo, dede que chegou à província romana da Judéia ostentava desprezo pelas suscetibilidades judaicas.
“Os evangelhos apresentam Pilatos como um homem justo, mas sem força de vontade e tão perturbado pela dúvida de condenar Jesus de Nazaré à morte que faz tudo em seu poder para salvá-lo, finalmente lavando as mãos de todo o episódio quando os judeus exigem seu sangue. Isso é pura ficção. Pilatos era mais conhecido por sua extrema depravação, seu total desrespeito pela lei e as tradições judaicas, sua aversão mal disfarçada pela nação judaica como um todo. Durante seu mandato em Jerusalém, ele tão avidamente enviou milhares e milhares de judeus para a cruz, e sem julgamento, que o povo de Jerusalém se sentiu obrigado a apresentar uma queixa formal ao imperador romano.”
Devolvei a César e a Deus
“Essa não é uma pergunta simples, claro. É o teste essencial do pertencimento à crença zelota. Desde a revolta de Judas, o Galileu, a questão de saber se a lei de Moisés permitia pagar tributos a Roma tornou-se a característica distintiva dos que aderiam aos princípios zelotas. O argumento era simples e entendido por todos: a demanda de tributo por Roma demonstrava nada menos do que uma reivindicação de propriedade sobre a terra e seus habitantes. Mas a terra não pertencia a Roma. A terra pertencia a Deus. César não tinha direito a receber tributo, porque não tinha direito à terra. Ao perguntar a Jesus sobre a legalidade do tributo a Roma, as autoridades religiosas estavam fazendo-lhe uma pergunta totalmente diferente: você é ou não é um zelota?
…Mostrai-me um denário”, diz Jesus, referindo-se à moeda romana usada para pagar o tributo. “De quem é esta imagem e esta inscrição?”
“É de César”, as autoridades respondem.
“Bem, então, devolvei a César a propriedade que pertence a César, e devolvei a Deus a propriedade que pertence a Deus.”
Em outras palavras, de acordo com Jesus, César tem direito a “receber de volta” a moeda de denário não porque ele mereça o tributo, mas porque é a sua moeda: seu nome e imagem estão estampados nela.
Deus não tem nada a ver com isso. Por extensão, Deus tem o direito de “receber de volta” a terra que os romanos tomaram para si, porque é a terra de Deus: “A terra é minha”, diz o Senhor (Levítico 25:23). César não tem nada a ver com isso.
Lestes, bandido, zelota
Então, devolva a César o que é dele, e devolva a Deus o que pertence a Deus. Esse é o argumento zelota em sua forma mais simples e concisa. E parece ser suficiente para as autoridades em Jerusalém rotularem imediatamente Jesus como lestes. Um bandido. Um zelota.”
O texto, produto da pesquisa, nos remete a um judeu diferente do que nos foi apresentado nas doutrinas.
O Jesus milagroso, nascido em uma manjedoura e revelado após conhecer João Batista, não passou de um revolucionário insatisfeito com a submissão do seu povo ao Império Romano: um Zelota.
No mais, a história descrita nos evangélicos traz um conjunto de ideias criadas para envolve-lo como divindade, objetivando uma concepção religiosa, caracterizada, principalmente, nas Cartas de Paulo com o objetivo de espiritualizar a mensagem de Jesus, o Zelota, e despolitizar suas propostas de luta contra a opressão do Império Romano aos judeus, anunciando a chegada do Reino de Deus.
Afinal, há muito aguardava-se a chegada de um Messias!
Reza Aslan
Nasceu em 1972, no Irã, vive em Nova York e Los Angeles.
É um iraniano-americano estudioso da religião, especialista em temas religiosos, formado em Harvard e na Universidade da Califórnia.
Estudou o Novo Testamento, grego bíblico, história, sociologia e teologia das religiões.
Publicou os livros Nenhum Deus além de Deus, e Zelota.
Referências bibliográficas
Aslan, Reza, 1972 –
Zelota: a vida e a época de Jesus de Nazaré / Reza Aslan; tradução Marlene Suano. – 1.e – Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
Tradução de: Zealot: the life and times of Jesus of Nazareth.
ISNB 978-85-378-1152-8
Edição digital: novembro 2013
ISBN: 978-85-378-1155-9
1. Jesus Cristo – Infância. 2. Jesus cristo – História. 3. Vida cristã. I. Título.
Zelota foi, sem dúvidas, um dos melhores livros que li nos últimos dois anos (eu o li em dezembro/2016), e é um dos meus livros de cabeceira! Minhas únicas dúvidas dizem respeito à suposta “conversão” de Paulo de Tarso e ao seu suposto “martírio”. Não é esclarecido por que um perseguidor ferrenho dos cristãos teria mudado radicalmente de idéia, a ponto de criar um “cristianismo à moda da casa” (há quem afirme que ele “virou a casaca”, porque viu que não daria conta de tantos cristãos em Damasco). E, embora Reza Aslan afirme, numa das notas finais, que a carta de Paulo onde ele afirma estar aguardando martírio não seja da autoria do apóstolo póstumo, ele, páginas antes, diz que tanto Paulo quanto Pedro foram executados em Roma (há quem diga que a tal carta teria sido escrita bem depois de 66/67 d.C., no intuito de transformar Paulo em mártir)…